30 Mar Contrato de arrendamento durante o surto de COVID19
A situação excecional de pandemia que estamos a atravessar exigiu, por parte do Governo, que fosse determinada a aplicação de medidas extraordinárias e de caráter urgente destinadas a garantir a estabilidade possível na vida dos portugueses, nomeadamente no que respeita ao Contrato de arrendamento durante o surto de COVID19, naquele que é um período de restrições à circulação de pessoas e bens.
Assim, e com o objetivo de proteger o direito à habitação, a Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, veio implementar um conjunto de medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pela doença COVID19. Tais medidas destinam-se à manutenção dos contratos de arrendamento durante o surto de COVID19 e passam pela i) suspensão da produção dos efeitos das denúncias feitas pelos senhorios dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, ii) pela suspensão das execuções de hipotecas sobre imóveis que sejam habitação própria e permanente, e ainda pela iii) suspensão dos procedimentos especiais de despejo e dos processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria.
Embora destinadas a atenuar os efeitos das quebras de rendimento provocadas nas famílias pelas medidas de combate à pandemia da COVID19, deverá ter-se em linha de conta que, no conjunto de medidas decretadas pelo Governo nos termos supra expostos, não está contemplada a suspensão do pagamento das rendas no contrato de arrendamento durante o surto de COVID19, à semelhança do que se ,vem discutindo e já foi aprovado ( em algumas situações), para o crédito à habitação. Quer-se com isto dizer que, mesmo durante o período de implementação das medidas acima expostas, os senhorios não ficam impedidos de resolver os contratos de arrendamentodurante o surto de COVID19 ( arrendamentos habitacionais ou não habitacionais,) , com base na falta de pagamento de rendas por parte dos arrendatários. Tal significa que, em caso de falta de pagamento de rendas por um período superior ao previsto na Lei, os senhorios podem resolver o contrato de arrendamento durante o surto de COVID19, ficando, porém, o efeito de tal resolução suspenso até que cesse o período de combate e tratamento à pandemia provocada pela COVID19
De igual modo, tenha-se em conta que, por via das medidas adoptadas pelo Governo destinadas à manutenção dos contratos de arrendamento durante o surto de COVID19, fica apenas prevista a suspensão dos efeitos da denúncia feita pelo senhorio o que significa que, mesmo durante o período em que vigora o estado de emergência provocado pela pandemia COVID19, os senhorios não ficam impedidos de denunciar os contratos de arrendamento, muito embora os efeitos da denúncia fiquem suspensos até à cessação do período em que vigoram tais medidas.
Ora, sendo certo que o conjunto de medidas adotadas pelo Governo visa a manutenção dos contratos de arrendamento durante o surto de COVID19, entendemos, porém, que tais medidas não contemplaram questões essenciais como por exemplo, a determinação de uma penalização mais baixa para os arrendatários que apenas entraram em incumprimento após o início do estado de emergência, de modo a que estes não sejam penalizados do mesmo modo que os arrendatários que já estavam em incumprimento, antes de ter sido decretado o estado de alerta devido à pandemia COVID19.
É certo que muitos senhorios dependem do valor das rendas que recebem para viver e que, por tal facto, não poderão suspender (ainda por cima por um período cujo fim ainda se encontra por determinar) o pagamento das rendas a que têm direito. Somos, no entanto, do entendimento que de entre as medidas adotadas deveria ter sido contemplada a destrinça acima mencionada no contrato de arrendamento durante o surto de COVID19, de modo a que os arrendatários cumpridores não paguem pela mesma moeda dos arrendatários que já eram incumpridores antes de ser decretado o estado de emergência devido à pandemia COVID19.
Há ainda que ter em conta, em especial para o arrendamento não habitacional, onde o evidente decréscimo do volume de negócios tem posto à prova a manutenção de tais contratos, que no conjunto das medidas adotadas pelo Governo, não se encontra prevista a possibilidade dos arrendatários poderem invocar o decréscimo da atividade para deixarem de efetuar o pagamento das rendas. Por certo que os arrendatários poderão justificar a falta de pagamento das rendas no contrato de arrendamento durante o surto de COVID19 invocando caso de força maior. Não poderão, porém, os arrendatários deixar de ter em conta que, a invocação de tal instituto como forma de suspensão do cumprimento das obrigações, dependerá da demonstração cabal de que a diminuição dos rendimentos operou por via do estado de emergência decretado o que, dependendo dos casos, poderá não ser assim tão fácil de demonstrar.
Já no que respeita à possibilidade prevista no nº 5 do artigo 1083º do Código Civil de resolução, pelo arrendatário, do contrato de arrendamento não habitacional por falta de aptidão do bem locado ao seu uso, é nosso entendimento que a procedência de tal argumento dependeria sempre de poder ser imputada a falta de aptidão do bem locado ao senhorio, o que não é o caso enquanto estiver em vigor o estado de emergência provocado pelo combate à pandemia provocada pela COVID19.
A diminuição momentânea do volume de negócios fruto da pandemia COVID19 não é, nos termos supra expostos, i) motivo bastante para que possa operar a resolução por parte do arrendatário por falta de aptidão do bem locado ao uso previsto no contrato, assim como também não é ii) motivo bastante para que os arrendatários deixem de cumprir com o pagamento das rendas no que aos contratos de arrendamento para fins não habitacionais respeita.
Ainda no que à matéria do contrato de arrendamento respeita, sabe-se que o Governo continua a trabalhar ativamente no sentido de minorar o esforço das famílias portuguesas, estando inclusivamente em curso a possibilidade de ser adoptado um regime de apoio ao pagamento das rendas habitacionais e não habitacionais durante o surto de COVID19, para quem tenha uma quebra de rendimentos demonstrada de 20% ou o esforço com habitação foi superior a 35% do rendimento familiar, ou mesmo a possibilidade de ser concedida uma moratória para o pagamento das rendas não habitacionais dos estabelecimentos que foram obrigados a encerrar devido ao surto de COVID19. Por definir está, no entanto, a questão de saber se estas medidas serão aprovadas, por quanto tempo e, em caso afirmativo, em que condições poderão os arrendatários beneficiar destes apoios que, ao que se julga, serão concedidos pelo IHRU.
Pese embora o exposto, nada impede, bem pelo contrário, que as partes, principalmente antes de se verificar o incumprimento do contrato de arrendamento durante o surto de COVID19, possam celebrar acordos de redução parcial de renda ou mesmo de prorrogação do prazo para o seu pagamento quer se trate de arrendamento habitacional ou não habitacional.
As circunstâncias excecionais que vivemos nos dias de hoje recomendam, acima de tudo, a razoabilidade e o bom senso de ambas as partes no que respeita à manutenção do contrato de arrendamento durante o surto de COVID19 de modo a que todos possam perder o menos possível durante todo o período em que estiverem vigor as medidas adotadas pelo Governo em resposta à situação epidemiológica provocada pela doença COVID19.
Acima de tudo, o presente texto pretende ter uma abordagem geral e abstrata sobre o regime dos contratos de arrendamento durante o surto de COVID19, o que não invalida que existam soluções específicas no caso concreto, que o advogado casuisticamente avaliará.
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